Eu estava lá quieto na sala de relaxamento da empresa na hora do almoço sentado com o corpo para frente com as duas mãos entrecruzadas olhando para o chão pensando formas de ganhar dinheiro no final de semana, tentando aplicar a técnica do “the secret” para atrair coisas boas quando meu gerente chega e diz:
- Olá pobretão lhe achei cara!
- Oi, tudo bem...
- Beleza. Olha nós vamos fazer uma viagem a trabalho pra um cliente e você vai ter que ir pois tá entendendo de assunto “X” e é importante que você cubra esta matéria bem quando necessário pois não podemos ter margem pra erro. Fale com a secretária para acertar tudo ok?
- O-ok chefe.
Ele se vai e minha cara de bunda olha para o vazio. Não sei como me sentir. Isso é bom? Isso é ruim? Penso se vai afetar meus aportes. Começo a ficar puto. Será que meu novo emprego está se tornando uma grande merda?
Vou falar com a secretária. Humildemente com meu rosto feioso com as mãos para trás chego no balcão, cumprimento ela e falo sobre a tal viagem. Ela é uma secretária linda e maravilhosa com uma perfume maravilhoso. Eu sou completamente apaixonado por ela, eu faria de tudo para tê-la só para mim, faria o sexo mais maravilhoso possível, beijaria ela toda mas ela não reconhece minha existência de um mero assistente de merda contra gerentões, superintendentes, diretores fodões. Ela então fala:
- Oi pobretão tudo bem!? Você mora onde? Seguinte, o taxi irá lhe pegar na sua casa e levar até o aeroporto de guarulhos basta pegar nota, pegue esta cooperativa. Passe seu CPF, RG e todos seus dados e vamos emitir sua passagem tá bom?
- Tá bom..
- Tá bom, tô aguardando querido.
Bem, continuando, eu mandei o email.
Chego em casa e tenho 2 dias até a viagem. Falo para minha mãe e ela fica toda orgulhosa. Então pergunto se temos uma mala. Ela diz que sim. Quando ela me traz a mala vejo um lixo imundo de mala, nem é daquelas de rodinha, é aquelas de mão toda antiga, fudida, feia, preta desbotada cagada, bem de pobre. Fico puto e digo “porra mãe não tem outra”, e ela diz que não. Como não quero gastar meu aporte e grana nisso e meu pai não vai comprar eu aceito aquele lixo.
Chega o grande dia da viagem. De manhã, acordando cedo puto da cara pra pegar a merda do avião o taxi chega na hora marcada. É um Vectra novo. O taxista pega a mala, põe no porta mala pra mim e abre a porta de trás pra mim. Nossa, nunca abriram uma porta pra mim. Minha mãe olha orgulhosamente para mim enquanto eu entro. Olho pra ela e digo tchau do portão. Um aperto no coração ocorre.
Chego em Guarulhos e começo a carregar aquela merda de mala horrorosa. Localizo meus colegas todos de malas de rodinhas lindas de plástico moderno cinzas, com roupas legais sociais. Chego com minhas roupas de cor tosca e mala de mão e tento colocar atrás do meu corpo pra disfarçar. Fico vermelho. Meus colegas cumprimentam e diz “bom, bora pro check-in”. Eu penso na minha cabeça “chek o que?”. Nunca andei de avião. Esperto que sou acompanho tudo que eles fazem.
Chega na hora de entrar naquela porra de máquina de raio-x e começa a humilhação de pobre. Eu coloco meus bens eletromagnéticos e com imãs na bandejinha mas ao passar no negócio de raio-x ele apita fortemente. Fico assustado e tento pegar minhas coisas mas o segurança diz para eu tirar o sapato. Eu pegunto “o que?”. Ele diz “tire o sapato senhor”. Eu tiro e ele me dá aquelas meias brancas para pôr no pé. Eu coloco. Eu passo de novo e apita. “Tire o cinto” ele diz. Eu tiro. Sou um homem patético sem cinto, sapato com proteção branca de mulherzinha andando pra lá e pra cá. Ao fundo meus colegas olham a cena. O segurança passa o detector várias vezes em mim, passando nos meus orgãos genitais. Um olhar triste para o nada corre no meu rosto. “Pobre é sempre humilhado” penso eu. O sofrimento de minha vida não tem fim. Ele me libera e eu vermelho nas bochechas pego meus objetos. Meu dia acabou.
Passado isso, pego o avião. Me cago nas calças na decolagem. Fiquei no meio das cadeiras enquanto meus colegas ficaram na janela dormindo e vendo a paisagem. Fiquei triste.
Chegamos no aeroporto da cidade de destino e meus colegas falam que estão loucos para comer no restaurante “X” que tem ótimo camarão. Fico nervoso pois poderá afetar meu aporte. Eles então mencionam que o vale refeição é de 40 reais ao dia. Eu solto um grito e digo “Quanto, 40 reais, como que é”, eles olham pra mim e eu disfarço e olho para o nada e digo “legal gente é bom mesmo hein, fala aí, he he he, cof cof, que ar seco hein”. Eu descubro então que não teremos que pagar refeição é tudo pago pela empresa. Um sorriso corre no meu rosto. Eu vou comer de graça? Um pobre adora comer de graça e fico super feliz e empolgado. Sinto vontade de mandar uma mensagem para minha mama mas tenho medo de gastar deslocamente do celular. Legal!
As reuniões ocorrem no cliente normalmente, eu faço minha parte sem dificuldades. Correu tudo bem. Na hora de ir pro hotel, eu fico chocado: É um super hotel legal, chique. Meus colegas nada impressionados correm para o check-in e eu fico olhando o hall, a entrada. Um rapaz vem pegar minha mala e eu quase dou-lhe uma mas era apenas o mensageiro. Ao entrar no quarto eu pareço uma criança: É lindo! Lindo, lindo, lindo, cama de casal, televisão flat screen, tv a cabo, wi-fi grátis. Entro no banheiro e tem uma banheira de hidromassagem! Não é possível!. Eu estou pulando no quarto, pulo na cama pelado, grito, vou na sacada e grito como Jack no Titanic “I’m the king of the world”, boto o som da televisão no alto. Ligo a banheiro de hidro, coloco um roupão, peço comida no quarto e coloco a TV para que eu possa ver do banheiro deitado na hidro. Localizo uns sais de fruta. Vejo se é de graça. São. Coloco tudo na banheira. Espumas e mais espumas aparecem. Eu estou no céu! Um pobre de merda como eu na hidro, em hotel de graça, sais de fruta de graça. Minha nossa que maravilhoso. Começo a cantar as músicas da televisão alto jogando espumas pro alto. Danço.
Pena que foi um dia só porém ao voltar já estou menos burro e tudo corre bem. Meus colegas falam que não deu pra ir dessa vez uma casa das primas e restaurante. Fico quieto afinal sou especialista em primas porém não quero revelar. Eles falam besteiras sobre as primas e fico agoniado e tento ignorar pois parecem sem experiência. Todo pobre é mestre neste assunto mas não quero pegar mal.
Volto para casa. Um Honda Civic me deixa em casa de noite. Minha mãe me recebe e me abraça:
- Como está meu executivo?
- Foi muito bom mãe
- Que orgulho.
Deito na cama do meu quarto fudido e casa feia. Penso em como é lindo ser rico e fodão. Penso em como é maravilhoso ser bem tratado. Penso em como nenhuma mulher me valoriza a não ser minha pobre mãe. Penso em como quero ser milionário e viver essa vida.
E durmo o sono dos pobre sonhadores tentando atrair coisas boas para minha vida.